aviso autorias anteriores idioma índice
pendular
O QUE SERÁ A UNIDADE DA TERRA?

Os uigures são uma das etnias muçulmanas mais importantes da China. Tanto a prática da sua religião, o Islão, como o uso da sua língua, o Uigur, são partes muito importantes da sua identidade. São uma etnia túrquica originária de Sinkiang, no nordeste da actual China. 


Historicamente têm sido sempre uma minoria reprimida pela cultura chinesa, desde a época imperial até ao período actual da República Popular da China (R.P.C.). Mas desde a chegada ao poder de Xi Jinping, em 2015, as políticas de repressão aumentaram, chegando alguns países muçulmanos e ocidentais a denunciar a existência de um genocídio contra o povo uigur. O governo da R.P.C. negou tais acusações. Em 2022, numa avaliação do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, a organização declarou que as políticas e acções da China na região de Sinkiang podem ser consideradas crimes de lesa-humanidade. 


Segundo este relatório e outros proporcionados por organizações de defesa dos direitos humanos, o governo chinês reprime duramente os uigures. Com o objectivo de reduzir a proporção da população uigur, maioritária na Região Autónoma de Xinjiang, favoreceu-se o assentamento de população da etnia Han (maioritária na China) nesta região. Isto foi feito dando prioridade à população han em relação à uigur na oferta de postos de trabalho, o que obrigou muitas pessoas uigures a procurar emprego fora de Sinkiang. Chegaram a ver-se cartazes com “Abstenham-se uigures” em algumas ofertas de emprego. Juntamente com esta pressão migratória dentro da região, o governo continua a exercer uma considerável pressão sobre as jovens uigures para que emigrem para outras partes do país, como forma de promover uniões mistas. As autoridades chinesas aplicam também uma política linguística que se apresenta como ensino bilingue na região, mas que transformou o mandarim na única língua usada no ensino. Começou-se por suprimir o uigur como língua na docência universitária, permitindo-o apenas   em disciplinas de poesia uigur. Foram acrescentadas medidas adicionais que fizeram do mandarim a principal língua de ensino nos níveis pré-escolares, despediram-se professores uigures e passou-se à imposição de multas a alunos e docentes que usassem a língua uigur dentro das instalações escolares. As autoridades impõem ainda um controlo rigoroso sobre as mesquitas e o clero, intervindo na nomeação dos imãs e enviando polícia para dentro e os arredores das mesquitas. As pessoas que trabalham para o governo na região arriscam-se a perder o emprego se participarem em actividades religiosas e os menores podem ser expulsos dos estabelecimentos de ensino. 


Usando a retórica da luta contra o terrorismo, os incidentes violentos ocorridos em 2008 em Sinkiang serviram de pretexto às autoridades para iniciar uma esmagadora campanha de repressão contra a população uigur, com milhares de detenções, julgamentos sumários e condenações de pessoas destacadas desta etnia. Foram impostas penas de até 10 anos de prisão a escritores, poetas e activistas em geral. Algumas confissões foram obtidas mediante tortura, por vezes infligida na presença de familiares próximos. Aumentaram-se os controlos nas ruas dirigidos à população muçulmana, assim como a vigilância intrusiva e as detenções arbitrárias. O doutrinamento político e a assimilação cultural forçada são implementados em massa em centros de internamento que têm como alvo as etnias uigur, cazaque e outras comunidades muçulmanas da região. Primeiro foram detidos familiares de pessoas destacadas pelas suas actividades no estrangeiro. 


Seguiram-se desaparecimentos de estudantes matriculados em universidades de países maioritariamente muçulmanos. Viajar para estudar, especialmente com destino a países muçulmanos, tornou-se motivo de suspeita para o governo chinês, que ameaça as famílias dos estudantes para os obrigar a regressar. Chegou mesmo a exigir a deportação de estudantes de países como o Egipto. De forma geral, o contacto com pessoas fora da R.P.C. representa um claro motivo de suspeita para as autoridades chinesas. Para evitar isso, muitas pessoas ui-gures, cazaques e residentes de Sinkiang cortaram os laços com familiares e entes queridos que vivem no estrangeiro. Toda a população pode ser sujeita a uma “transformação”. Não foi tornada pública uma lista dos critérios específicos para determinar quem deve ser detido. Em alguns locais, foram divulgadas listas de “sinais de extremismo” e “actividades religiosas ilegais”, que incluem deixar crescer uma barba “anormal”, usar véu ou lenço na cabeça, rezar regularmente, jejuar, evitar o álcool ou possuir livros ou artigos sobre o Islão ou a cultura uigur. Existem até relatos e rumores que indicam que, pelo menos em certos locais, as autoridades poderão estar a deter pessoas de forma indiscriminada para cumprir quotas mínimas de detenções. 


As detenções também provocam a separação de crianças dos seus pais ou mães. As mais velhas podem ser enviadas para centros de formação profissional estatais, enquanto as mais novas acabam em grandes “centros de bem-estar”, ignorando os pedidos de familiares que reclamam a sua custódia. Inicialmente, o governo chinês negou a existência destes centros, mas foi forçado a reconhecê-la perante a evidência acumulada por várias organizações a favor dos direitos humanos. As autoridades chinesas apresentaram estes centros como centros de formação e capacitação profissional, embora na realidade funcionem como instalações onde se tenta substituir a crença religiosa e a identidade étnica por uma lealdade política secular e patriótica. As condições nestes centros são extremamente duras, existe sobrelotação, insalubridade e maus-tratos frequentes; qualquer acto de desobediência é severamente punido, e o uso de tortura, especialmente o uso da “cadeira do tigre”, onde a pessoa é amarrada durante horas ou até dias, é utilizado habitualmente para submeter os detidos.


Raúl Granados B.

Partilhar
Raúl Granados B.