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OURO DE TOLO - ENTREVISTA A GUILHERME CORREIA

Costumamos dizer que o dinheiro não é tudo. Mas, na hora da verdade, são poucas as pessoas que escolhem viver as suas paixões. É impossível ser livre sozinho, é certo. Mas também é certo que é preciso aproveitar os minúsculos momentos de autonomia a que por vezes temos acesso, aqueles momentos da vida em que podemos gritar que valeu mesmo a pena, aconteça o que acontecer. É por isso que fizemos esta entrevista, para que continuemos a sonhar, em conjunto, com uma vida diferente para toda a gente. Entrevistámos um amigo nosso, que decidiu não sucumbir ao ouro de tolo, àquela vida chata que por vezes vivemos sem sequer nos darmos conta. E aprendemos com ele.


p.: Estudaste economia e, durante os primeiros anos da tua vida laboral, tiveste trabalhos nessa área. O que é que te fez ir para esse curso? E o que te fez continuar e acabá-lo?


r.: Estudei economia porque gostava de política. Na altura pareceu-me o curso que mais se enquadrava. Rapidamente entendi que o curso nada tinha a ver com o que imaginava na minha cabeça, que era economia política. Acabei por continuar o curso porque sabia que abria muitas portas no mercado laboral e, na altura, não tinha ideia do que queria fazer. Não tinha maturidade nem confiança suficiente para me virar para outro lado. Deixei só a vida correr. 


p.: E quais foram as tuas primeiras experiências laborais, relacionadas com o teu curso? 


r.: Trabalhei em duas associações patronais, que apesar de serem de um espetro oposto ao meu em termos políticos, pelo menos tinham algo de político em que podia utilizar os conhecimentos que tinha de economia. Sabia desde o primeiro momento que não ia passar lá muito tempo, mas achei que podia abrir portas para outros trabalhos. 


p.: Como é que se desenvolveu a tua rejeição a esse ambiente? Começaste logo a pensar em alternativas?


r.: A rejeição não começa logo no início, tendo em conta que na altura estava só contente por ter um trabalho. Tinha uma visão muito de miúdo em relação ao trabalho, para mim ter algum dinheiro e vestir um fato todos os dias chegou-me nos primeiros tempos para me sentir bem. Claro que não durou muito e ao fim 2 anos deixei esse trabalho para ficar a escrever a tese de mestrado.


p.: Como é que surgiu a ideia da carpintaria, então?


r. Surgiu numa fase em que me despedi do último trabalho e não sabia o que ia fazer. Estava num momento de grande crise existencial, em que via a vida a passar-me ao lado. Foi o momento mais decisivo da minha vida até hoje. Sinto que foi quando deixei de ser um jovem para ser um homem. Até aí nunca tinha realmente levado a vida muito a sério e entendi que a minha maturidade era muito mais superficial do que achava. 


Foi o momento em que despertei para a realidade: ninguém ia resolver a minha vida por mim. Não podia ser passivo e andar de trabalho em trabalho, com medo. Tinha de ser mais revolucionário na forma como vivia. Não foi uma ideia óbvia, a da                     carpintaria / marcenaria. Pensei em ser programador, analista de dados…ainda muito preso ao paradigma anterior, de trabalho de secretária com emprego garantido e algum status social. Tudo opções que ainda revelavam imensa falta de confiança para arriscar a sério.


p.: O teu desejo, ao começar neste novo sector, era recuperar uma certa arte perdida? Ou olhas para a carpintaria como uma arte adaptada ao presente, incluída nas correntes artísticas do presente?


r.: Uma das coisas que mais me fascinava nesta área era o orgulho que havia nos profissionais e a relação de mestre e aprendiz. Havia alguma coisa nesse lado humano de passagem de testemunho que achava muito potente e raro. É uma coisa que ainda hoje me emociona. Posso dizer que nas duas oficinas em que trabalhei houve sempre uma relação desse tipo, mais ou menos forte. 


Estou muito grato por ter tido pessoas que estiveram disponíveis para me ensinar quando não sabia praticamente nada do que estava a fazer. 


p.: Por último, sentes que as encomendas que vais realizando, são obras tuas? Tens tempo para a criação artística? 


r.: Ainda não são. Ainda me falta muito para lá chegar, mas julgo que vai ser esse o caminho.


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