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RELÂMPAGO! LUTA DE CLASSES, ALLEZ!

Mais gente quer um clube


Quando em 2019 me falaram da possibilidade de criar o que viria a ser “O Relâmpago” (Associação Desportiva e Recreativa “O Relâmpago”) não quis acreditar: “Há mais gente a querer fazer um clube?”. Ainda sem nome, reuni pela 1ª vez no Solar dos Mouros (no início da Rua do Poço do Mouros). Na mesa do restaurante, entre nódoas de gordura e salpicos de imperial, estavam desenhados à mão cerca de 30 emblemas possíveis na toalha de papel típica das tascas. Ainda no solar percebi que estávamos unidos em torno de uma ideia: criar uma associação que usasse o desporto como pano de fundo para reclamar a transformação política e social e para reclamar o nosso direito à rua, ao espaço comum. Outra questão importante, foi também reclamar o nosso direito a não fazer nada, aliás a fazer tudo. Reclamar por um espaço físico e psicológico de abstração, de convívio, reclamar por um “sítio” para a libertação, para o excesso, para o erro e para reclamar o  direito ao improviso sem preconceito. Aí, percebi que o nome estava a ser colocado em cima da mesa: Relâmpago. Uma homenagem ao extinto Relâmpago FC, um dos vários clubes da zona do Beato que apareciam e desapareciam ao ritmo do fecho e abertura de fábricas (ainda hoje, no nosso aniversário, voltamos ao local onde era a sede deste clube, nas traseiras de uma mercearia). 


Fundação, ciclistas e lágrimas 


Com a pandemia no início de 2020, a fundação oficial foi sendo adiada. Ficámos com mais tempo para preparar o arranque da associação mas a vontade de aparecer era muita, não só nossa mas também das pessoas que a pouco a pouco iam sabendo do projeto. A vontade de pertencer era enorme e percebemos desde aí que estávamos no bom caminho. Logo no primeiro ano de atividade percebemos que já tínhamos perdido o controlo, e ainda bem, já não conhecíamos todos os nomes na lista de sócios e as t-shirts do Relâmpago espalhavamse pela cidade e apareciam nos sítios mais improváveis. 

Quando fizemos, toda a gente e não só o núcleo de fundadores, a primeira Subida da Rampa do Vale de Santo, percebemos que tínhamos nas nossas mãos um poder imenso. Juntamente com o Mirantense FC, recuperámos uma prova de ciclismo mítica da cidade de Lisboa que havia sido interrompida 

nos anos 50. 

Com a força do bairro reerguemos a prova e demos o impulso que faltava para o Mirantense voltar a ser um dos centros da freguesia. 

Estarão a mentir se alguns fundadores disserem que não choraram nesse dia. Nessa manhã, vindos não sei de onde, grupos de pessoas e de ciclistas responderam 

massivamente ao apelo de voltar a fazer das ruas nossas. 

Lembro-me de estar a tirar imperiais e comentar em lágrimas com outro fundador: “Já está, saiu do nosso “controlo”. De onde é que veio esta gente toda?!” 

Passados 4 anos ainda não parece real (a fundação oficial passou para maio de 2021). Durante esse período organizámos 4 provas de ciclismo (Subida da Rampa do Vale de Santo António), montámos 2 equipas de futsal (feminina e masculina) que competem em provas oficiais (INATEL e CML), temos uma secção de atletismo com dezenas de atletas e um grupo de boxe e outro de xadrez que têm treinos regulares há mais de 2 anos. 

Entretanto o Solar dos Mouros fechou para dar lugar a mais um lugar inacessível, mas o Relâmpago segue e carrega a marca das pessoas que querem ter o direito a tudo.


Vasco Campos



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Vasco Campos